A decisão do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) em condenar o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad) e seis associações de defesa dos direitos autorais por formação de cartel foi histórica e deve dar início uma discussão sobre a legislação do setor, avaliam especialistas na área.
Na quarta-feira, o Cade determinou que as entidades devem pagar multa de R$ 38,2 milhões por práticas julgadas como abusivas, sendo R$ 6,4 milhões a parte referente ao Ecad e R$ 5,3 milhões o valor imposto a cada uma das seis entidades que compõem o escritório: Associação Brasileira de Música e Artes (Abramus), União Brasileira de Compositores (UBC), Sociedade Brasileira de Administração e Proteção de Direitos Intelectuais (Socimpro), Associação de Músicos, Arranjadores e Regentes (Amar), Sociedade Brasileira de Autores Compositores e Escritores de Música (Sbacem) e Sociedade Independente de Compositores e Autores Musicais (Sicam).
– Essa discussão sobre a postura do Ecad já havia sido levada ao Cade antes, mas pela primeira vez resultou em condenação – diz Benny Spiewak, advogado especialista em direitos autorais e propriedade intelectual com escritório em São Paulo. – O Ecad, por ser uma entidade privada, criou suas próprias regras, que o próprio órgão fiscaliza com poder de polícia. O que se questiona não é a obrigatoriedade do pagamento, mas sim a falta de transparência e de critérios para a cobrança.
Essa condenação junto ao Cade tem origem num processo instaurado em 2010 a pedido da Associação Brasileira de Televisão por Assinatura (ABTA). O Ecad aplica às emissoras de TV paga a tributação única de 2,55% sobre a receita bruta.
– Isso numa grande emissora representa um valor enorme arrecadado, mesmo que ela não veicule nenhuma música em boa parte do tempo – explica Spiewak. – E não parece razoável que um canal de documentários como o Discovery pague o mesmo que a MTV, por exemplo. A decisão do Cade valoriza o direito autoral no Brasil e abre espaço para o diálogo e para que se revise arbitrariedades como impor que um restaurante recolha para o Ecad uma taxa com base na área do estabelecimento.
Esse é o entendimento também do advogado de Thomaz Cinel, do escritório Robert Juenemann, de Porto Alegre, que atua na área de propriedade intelectual:
– É provável que, caso sejam realmente efetivadas as punições, além da modificação da legislação específica do setor, o que é uma reivindicação crescente, o próprio Ecad busque maior transparência nos métodos adotados para a arrecadação e distribuição dos direitos do autor, uma vez que, diante das perdas, buscará evitar novas condenações.
O que diz o Ecad
O Ecad e as associações punidas anunciaram que “recorrerão desta decisão por entenderem que a estrutura de gestão coletiva criada pelos artistas musicais brasileiros foi esfacelada pelo Cade, que comparou as músicas a meros produtos de consumo e aplicou penalidades em razão do livre exercício dos direitos por seus criadores”, informa a nota divulgada pelo escritório. “A decisão do Cade criminaliza os criadores musicais e privilegia os interesses das TVs. Lamentável que uma autarquia federal não entenda a importância da música para o Brasil”, declara no comunicado Gloria Braga, superintendente executiva do Ecad.
A atribuição do Ecad e seus afiliados é zelar para que todo autor de uma obra musical (compositores, intérpretes, músicos, gravadoras e editoras musicais) seja remunerado pelo uso da mesma nos diferentes meios de difusão existentes. Diante da inviabilidade de se realizar acordos de veiculação individuais com esses múltiplos meios, o Ecad faz o recolhimento total e o rateio do pagamento aos associados. Existem diferentes tabelas de preços e metodologias de cobrança. O pagamento ao Ecad é obrigatório tanto na realização de um grande show internacional quanto numa festa de casamento. Pagam da mesma forma uma grande rede de televisão quanto uma pequena rádio do interior.
Criado em 1973, o Ecad tem natureza privada e é administrado por associações representativas da área musical. Com sede na cidade do Rio de Janeiro, tem 28 unidades arrecadadoras, 52 escritórios de advocacia prestadores de serviço e 99 agências autônomas instaladas em todos os Estados do Brasil. Estão catalogadas em seu banco de dados 3,2 milhões de obras. No balanço de 2011, o Ecad informa uma arrecadação de R$ 540,5 milhões e a distribuição de R$ 411,7 milhões (77% a brasileiros e 23% a estrangeiros), valores superiores aos de anos anteriores – em 2010, foram R$ 432,9 milhões e R$ 346,4 milhões respectivamente.
Fonte: ZH
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